____Uma coisa
interessante no caderno do jornal O Globo, Rio Show, é o tema de certas
reportagens de capa. Não é porque sou ávida freqüentadora de casas
noturnas ou bares pela Lapa, mas, como todo adolescente ou jovem adulto,
tenho uma vida social ativa (e cobrada pelos amigos), de forma que vez
ou outra a reportagem da capa me chama a atenção. Numa antiga edição, li a
matéria “O importante é compartilhar” sobre interessantes curiosidades
da super exposição de pessoas da minha faixa etária: diferentes tipos de
compartilhamento de fotos em eventos, boates, etc. Resumidamente, a
reportagem trouxe uma das atrações principais das festas cariocas:
jeitos de postar no Facebook, Instagram, Twitter, etc. etc. etc., que
você esteve em determinada festa ou evento.
____
Não vou negar que não acho
divertida a idéia de ter minha foto projetada no telão em tempo real,
depois de posar para um Iphone qualquer e botar a hashtag #festadaora.
Ou então a cabine de fotos que imprime na hora as fotos tiradas com os
amigos. Um espelho sensível ao toque em que se tira foto de si mesmo e
pode compartilhar em qualquer rede social? No mínimo, muito legal.
Confession de Pawel Kuczynski |
____Uma das entrevistadas disse: “Quando a gente se produz para sair à noite, quer mesmo é que
todo mundo veja. Com a foto postada na mesma hora, a coisa fica melhor. É
ótimo para provocar um ex-namorado". Não acho que ela esteja errada. Ou melhor, é
irrelevante a minha opinião. Mais importante que isso é saber que, para a
maior parte dos jovens cariocas que saem à noite para baladinhas ou
bares agitados, essa é a idéia mesmo. As pessoas, mais do que nunca,
querem ser vistas e fazem questão de mostrar isso.
____Já faz um ano que dei adeus à principal rede social
desde a invenção da internet: o Facebook. Podem me chamar de radical,
mas fui vendo a coisa com outros olhos quando certas postagens apareciam
no meu feed. Sem entrar em muitos detalhes, tudo aquilo que todo mundo
reclama sobre o Facebook (postagens irrelevantes, fotos espontaneamente
forjadas, chamadas para eventos aleatórios, além de pouca privacidade)
me fizeram chegar a um nível de irritação com o site tão grande que eu
não hesitei em deletar a minha conta – e fazer um lembrete de não avisar
a ninguém, antes que fizessem algum tipo de chantagem emocional comigo.
____Depois disso, vieram reações diversas dos amigos:
gente me amaldiçoando por não conseguir falar comigo, colegas me
parabenizando e algumas piadinhas. A amiga dizia “queria te mandar um
vídeo” e, com certa derrota e um misto de vergonha, eu respondia “manda
por e-mail”. Não tinha jeito. Sempre alguém dizia, ironicamente, “por
e-mail? Pode ser por carta? Ou prefere bilhetinho debaixo da porta?”.
Mas já me acostumei.
____Já que estamos falando de vida noturna e fotos
comprometedoras, eis o meu questionamento. Lembro bem das fotos de
amigas – bem, não exatamente amigas, talvez colegas ou simplesmente
“gente que vi uma vez na vida” – super produzidas, com vestidos curtos e
maquiagem pesada. Amigos – ou “gente com quem eu nunca troquei um oi”-
postando fotos na 00 com uma vodca na mão, abraçado com os
“parceiros”, fazendo aquela cara de bebinho.
____Interessante mesmo.
____Eu ficava me perguntando “o que essas pessoas
querem provar?”. Porém, veja só, comecei a ver a coisa de outra forma. Não é “o que”, mas “quem”. Digo, “quem essas pessoas querem atingir?” seria a pergunta certa.
____A reportagem até traz uma fala de um especialista,
já que o tema sobre a vida não tão privada dos jovens tem sido alvo de
discussões. A verdade é que o Facebook perdeu um pouco do sentido para
mim, a partir do momento em que percebi que tudo dele era um novo
“cartão de visitas” e as pessoas projetavam um “eu” que não era
correspondente ao real.
____Não à toa, “Face” e “Book” remetem a uma espécie de
“catálogo de rostos”, numa interessante interpretação, que vai além da história do surgimento da rede social. Não se julga
pelo que se fala, pelo que se é. Mas pelo que se parece (ou
aparece). Não importa se fulaninha seja a garota mais engraçada que você
já conheceu: ela não é bonita o suficiente. Não importa se aquele cara
tem ótimas idéias: ele tem as fotos bloqueadas. Não importa se você está
namorando: se não está no status, é mentira.
____Talvez eu não tivesse me rebelado tanto contra a
rede social se as pessoas soubessem usá-la. Eu tinha quinhentos e tantos
amigos na minha lista do Facebook. Com quantos eu realmente falava? Com quantos eu realmente saía? Quantos eram meus melhores amigos? E
recusar uma solicitação de amizade – mesmo que você não seja amigo de
fato da pessoa – é considerado má educação! Eu precisava
me submeter a postagens sem qualquer relevância no meu feed de
“notícias” sobre gente que eu nem lembrava quem era.
____Sem contar que, como qualquer jovem, a grande
maioria está sujeita a ultrapassar certos limites e, às vezes, não
porque querem, mas porque ainda não tem o tato social e noções do que é
aceitável ou não de se expor abertamente a qualquer público. Ou seja,
certos comentários ofensivos e desnecessários, certas fotos, certas
“curtidas”… Todo dia eu me deparava com alguma coisa socialmente bizarra
demais.
____Sinto falta do tempo em que as fotos eram tiradas
para se lembrar de momentos e não para provocar inveja em meninas feias
ou ciúmes em ex-namorados. A época em que as fotos eram tiradas (e
reveladas!), posteriormente guardadas numa caixa ou num álbum de fotos –
às vezes, se fossem muito importantes, expostas num porta-retrato, na
privacidade do lar – e, num momento de completa nostalgia, folheava-se
páginas e páginas de momentos maravilhosos. Com a popularização de
câmeras digitais, com as quais se pode tirar mil fotos e apagar 900 que
ficaram ruins, o “momento” da foto fica cada vez mais banalizado e usado
para ser postado em alguma rede social, para provar que você foi a
algum lugar muito interessante, com seus melhores amigos do mundo para
atrair a atenção de tantas outras pessoas que estão interessadas na vida
alheia.
____A vida tornou-se um show. Faz-se de tudo para
ganhar setenta curtidas na foto postada do Instagram e, para isso, não
são medidos esforços. Vale tudo. Desde apelação sexual até bizarrices
inimagináveis. Ser famoso na internet não é menos interessante do que
ser famoso “na vida real”. Desde que se seja famoso, em primeiro lugar.
____E então as pessoas são movidas pelo que elas querem
parecer no mundo virtual e se esquecem das coisas mais importantes do
que acontece, literalmente, na frente delas. Momentos em que há dez
cabeças sentadas numa mesa de bar e não se tem conversa ou qualquer interação,
porque todo mundo está ocupado demais esperando o 3G funcionar.
____A verdade é que eu percebi que eu não precisava
disso. Eu não queria provar nada a ninguém. Muito pelo contrário: eu
sentia falta da minha privacidade e de manter a minha lista de amigos
restrita apenas à minha lista telefônica. Eu finalmente percebi que é
muito mais gostoso ter um almoço com um amigo que você não vê faz mais
de um mês do que mandar uma inbox dizendo que sente saudades e ficar por
isso mesmo.
____Eu não quero terminar esse texto com aquela
pergunta clássica “e você?”. No fundo, eu reconheço que o Facebook tem
suas vantagens também. A minha cartada final é apenas relatar a minha
maravilhosa experiência de não perder mais o meu tempo com babaquices
alheias (que devem inevitavelmente tomar parte do seu tempo diário, caso
o leitor tenha uma conta ativa) e perceber que a maior parte das
pessoas ainda não quer fazer nada a respeito de coisa alguma, mas acham
que fazem ao compartilhar um texto de cunho político ou curtir uma
página do Rio Eu Amo Eu Cuido.
____Àqueles que imploram para que eu volte para o mundo
mágico da fantasia virtual: eu voltarei (algum dia, mas voltarei).
Enquanto isso não acontece, eu afirmo: há vida após Facebook.